Muitas vezes ouvimos dizer que pessoas são contratadas como pessoas jurídicas, as PJs. É comum no imaginário popular a ideia de que para trabalhar em determinados nichos de mercado seria necessário criar uma empresa ou ao menos inscrever-se no CNPJ por exigências do próprio tipo de serviço e das empresas que atuam no ramo.
A “pejotização”, expressão baseada na sigla PJ, consiste na criação de uma pessoa jurídica ou, ao menos, na inscrição no CNPJ, para prestação de serviço por parte de uma pessoa física que é paga pelo contratante.
A questão assume relevância quando analisada sob a ótica trabalhista e a intenção da parte ou das partes envolvidas em praticar a “pejotização” para fraudar uma relação de trabalho.
Por exemplo, pensa-se num médico que trabalha todos os dias, com horário definido em um único hospital. Em vez de ser contratado com assinatura em carteira, o médico constitui-se como microempreendedor individual (MEI) e inscreve-se no CNPJ. A partir daí, o médico presta serviço ao hospital que emite notas fiscais a ele, pagando pelos serviços contratados.
Nesse caso, estão presentes todos os requisitos que, segundo a CLT, definem uma relação de trabalho:
– Subordinação: O médico está subordinado às ordens do hospital.
– Habitualidade: O médico trabalha com frequência definida para o hospital.
– Pessoalidade: O hospital contratou o médico em virtude de suas qualificações pessoais e profissionais.
– Onerosidade: O médico presta seus serviços mediante remuneração.
Na visão popular, o atrativo da “pejotização” seria diminuir os encargos trabalhistas do empregador e aumentar o valor pago diretamente ao empregado. A relação formal de trabalho possui encargos que oneram a folha de pagamento do empregador e, muitas vezes, não se transformam de modo imediato em dinheiro para o empregado. São exemplos conhecidos a contribuição ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e a contribuição previdenciária ao INSS.
Embora a prática possa parecer atrativa, ela tem potencial de gerar consequências jurídicas. Isso porque o artigo 9º da CLT declara como nulos os atos praticados com o objetivo de desvirtuar a aplicação da lei trabalhista.
Em outras palavras, a lei impede que a relação celebrada entre o “empregado PJ” e o contratante dos serviços seja legal. Uma vez desfeita a “pejotização”, deve ser reconhecida a relação de trabalho na forma da lei, aplicando-se todos os encargos trabalhistas devidos.
Assim, a “pejotização” expõe o contratante ao risco econômico de, futuramente, ver reconhecido o vínculo trabalhista entre ele e o “empregado com CNPJ” perante a Justiça do Trabalho, devendo arcar com todas as verbas trabalhistas e previdenciárias previstas em lei.
Desse modo, a empresa contratante perde duas vezes: os valores pagos a mais ao “empregado com CNPJ” para tornar atrativo o uso da “pejotização” não podem ser reavidos e ainda torna-se necessário arcar com os encargos legais devidos.
Portanto, é preciso prudência por parte das empresas no momento de contratação de pessoas jurídicas como prestadoras de serviço habitual, de modo a evitar potencial reconhecimento de relação empregatícia.
Referida análise torna-se particularmente necessária nos casos de prestação de serviços frequentes por uma única pessoa na qual a relação comercial entre a contratante e o prestador de serviço represente a maior parte das rendas desse último. Nesse sentido, é sempre aconselhável uma assessoria jurídica preparada para realizar eventual adequação de empresas à lei trabalhista, mitigando riscos jurídicos e econômicos que poderiam ser mais gravosos.
PEDRO DO AMARAL FERNANDEZ RUIZ
Graduando em Direito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – Campus Ribeirão Preto (FDRP/USP).